A religião do Antigo Testamento, como a do Novo, é uma religião histórica: funda-se na revelação feita por Deus a determinados homens, em determinados lugares e circunstâncias, e nas intervenções de Deus em determinados momentos da evolução humana. O pentateuco, que reproduz a história dessas relações de Deus com o mundo, é o fundamento da religião judaica e tornou-se seu livro canônico por excelência, sua lei.
Nele encontrava o israelita a explicação do seu destino. Não apenas tinha, no começo do Gênesis, a resposta ás interrogações que todo homem se faz sobre o mundo e a da vida, sobre o sofrimento e a morte, mas encontrava também resposta para seu problema particular: Por que IahweH, o Único, é o Deus de Israel? Por que Israel é seu povo entre todas as nações da terra? É porque Israel recebeu a promessa. O Pentateuco é o livro das promessas: a Adão e Eva após a queda, o anúncio da salvação longínqua, o Proto-evangelho; a Nóe depois do dilúvio, a certeza de uma nova ordem ao mundo; e a Abraão principalmente. A promessa que lhe é feita é renovada a Isaac e a Jacó e se estende a todo o povo deles nascido. Essa promessa se refere imediatamente á posse do país em que viveram os Patriarcas, a
Terra Prometida, mas implica outras coisas mais; significa que existem entre Israel e o Deus dos Pais relações especiais, únicas.
Pois IahweH chamou Abraão, e nessa vocação já se prefigurava a eleição de Israel. Foi IahweH que fez dele um povo e deste povo seu povo, por uma eleição gratuita, por um desígnio amoroso concebido desde a criação e continuando através de toda as infidelidades dos homens.
Essa Promessa, e essa eleição são garantidas por uma aliança. O Pentateuco é também o livro das alianças. Uma já e feita, embora tácita, com Adão, ela é explícita com Noé, com Abraão, com todo o povo, enfim, pelo ministério de Moisés. Não se trata de um pacto entre iguais, pois Deus não necessita dele e é ele quem toma a iniciativa. No entanto, ele se compromete, se obriga, de certa maneira, pelas promessas que faz. Mas exige, em contrapartida, a fidelidade de seu povo: a recusa de Israel, seu pecado, pode romper o vínculo que o amor de Deus formou.
As condições dessa fidelidade estão reguladas pelo próprio Deus. Deus dá sua lei ao povo que escolheu para si. A lei ensina-lhe seus deveres, regula sua conduta conforme a vontade de Deus, e, mantendo a aliança, prepara o cumprimento das promessas.
Esses temas da Promessa, da Eleição, da aliança e da Lei são os fios de ouro que se entrecruzam na trama do Pentateuco e continuam seu curso por todo o Antigo Testamento. Pois o Pentateuco não é completo em si mesmo: menciona a promessa mas não a realização, já que termina antes da entrada na Terra Santa. Devia permanecer aberto como uma esperança e uma exigência: esperança nas promessas, que a conquista de Canaã parecerá cumprir (Js.23), mas que os pecados do povo comprometerão e que os exilados recordarão na Babilônia. Exigência de uma lei sempre premente, que permanecia como que uma testemunha contra Israel (Dt.31:26).
Esta situação continuou até Cristo, que é o termo para o qual tendia obscuramente a história da salvação e que lhe dá todo os seu sentido. Paulo salienta o significado deste fato, sobretudo em Gl.3:15-29. Cristo concluiu a Nova aliança, prefigurada pelos pactos antigos e nela faz entrar os cristãos, herdeiros de Abraão pela fé. Quanto á Lei, ela foi dada para guardar as promessas, como um pedagogo que conduz a Cristo, em quem estas promessas se realizam.
O cristão não está mais sob o pedagogo, está libertado das observâncias da Lei mas não de seu ensinamento moral e religioso. Pois Cristo não veio ab-rogar e sim levar á perfeição (Mt.5:17); o Novo Testamento não se opõe ao Antigo Testamento, prolonga-o . Não só a Igreja reconhece nos grandes eventos da época patriarcal e mosaica, nas festas e ritos do deserto (sacrifícios de Isaac, passagem do mar Vermelho, Páscoa, etc.), como também a fé cristã exige a mesma atitude funda mental que os relatos e os preceitos do Pentateuco prescreviam aos israelitas. Mais ainda: em seu itinerária para Deus, toda alma atravessa as mesmas etapas de desapego, provação e purificação pelas quais passou o povo eleito, e encontra sua instrução nas lições que foram dadas a estes, principalmente instruções nas lições de seus erros, erros estes que todas as religiões tentam esconder não entendendo que estes erros são como espelhos para nossos acertos.
Uma leitura cristão do Pentateuco deve seguir antes de tudo a ordem dos relatos:
O Gênesis, depois de haver oposto ás bondades de Deus Criador as infidelidades do homem pecador, mostra, nos Patriarcas, a recompensa concedida á fé;
O Êxodo é o esboço de nossa redenção;
O Números representa o tempo de provação em quem Deus instrui e “castiga” seus filhos, preparando a congregação dos eleitos.
O Levítico poderá ser lido com mais proveito em conexão com os últimos capítulos de Ezequiel ou depois dois livro de Esdras e Neemias; o sacrifício único de Cristo tornou caduco o cerimonial do antigo Templo, mas suas exigências de pureza e de santidade no serviço de Deus continuam sendo uma lição sempre válida.
A leitura de Deuteronômio acompanhará bem a de Jeremias, o projeta de quem ele está mais próximo pelo tempo e pelo espírito.